terça-feira, 26 de abril de 2011

HOMENS & DEUSES E MEU AMIGO E EU.

Era Sexta-feira Santa (não tão santa, mas certamente sagrada); um dia daqueles que ficam gravados na memória, cravados na alma, com gosto de presente, de surpresa de amigo, você sabe.
Meu amigo chegou, sem programação prévia, no meio da tarde com uma sacolinha de chás, um monte deles, deliciosamente cheirosos; na outra mão, um filme que ele baixou da internet (atire a primeira pedra quem nunca o fez ou ficou tentado em fazê-lo- melhor pular essa parte) e uma caixinha de bombons caseiros, aqueles que escondem um morango, uma uva ou um pedaço de abacaxi doce no miolinho.
O filme era Des hommes et des dieux (Homens e deuses), uma história emocionante que trata com grandeza da nossa pequenez diante do assombro da vida crua, fria, sem temperos, sem cheiros... Enquanto isso uma torta de maçãs dourava lentamente no forno e perfumava a casa toda... O filme começa assim: “Eu disse: ‘vocês são deuses; todos vocês são filhos do Altíssimo Deus. Porém morrerão como os homens comuns morrem; a vida de vocês acabará como a de qualquer príncipe’. Vem, ó Deus, e governa o mundo, pois todas as nações são tuas.” (Salmo 82)
O jeito foi aprumar-se no sofá. Sentimos que seríamos golpeados pela história... E fomos! Fizemos, claro, algumas pausas para a degustação dos chás com fatias da torta ainda morna e para digerir pedaços do filme... E a tarde se foi assim, fatiada, saboreada aos poucos... Sobre a mesa, quase nenhuma sobra, só migalhas da torta, xícaras tingidas pelo colorido dos chás, outras de café, uma pequena família de abelhas que vieram sei lá de onde; duas Bíblias abertas no Livro dos Salmos, A descoberta do mundo de madame Lispector e Sopa escaldante de Lucinda Personna...
Ainda tínhamos fome, mas agora era de “sal”. Preparei um penne ao molho de mostarda com estragão e uma polentinha de manjericão roxo (não se trata aqui de combinação de pratos, e sim de fome e de comer o que se tem). E não é que ficou bom?!
Falamos sobre “coincidências”. Concluímos que elas realmente não existem e mais: Deus é um cara danado de esperto pra dizer as coisas... Mandou até abelhas pra confraternizar com dois malucos. Amém, digo, bon appétit (pra não perder o costume).



P.S.: Já ia me esquecendo: fala-se francês e árabe no filme, mas as legendas eram em inglês; conversávamos em português... Isso não é quase uma Babel moderna? E ainda tem gente que acha que deveria existir uma única língua universal. Deus nos defenda! O que seria do encanto, da magia da diversidade?

segunda-feira, 4 de abril de 2011

BOM À BEÇA


La bouillabaisse, uma “sopa” de peixes de água salgada, é uma especialidade do sul da França. Acredita-se que esse famoso cozido de peixes tenha suas origens na antiguidade e sua criação veio das mãos dos pescadores das pequenas praias da costa mediterrânea. Originalmente muito simples e sem nenhuma sofisticação no preparo, coisa de pescadores famintos que se contentavam em ferver a água do mar e jogar ali, algumas sobras de peixes ou peixes inteiros que não tinham valor de mercado e cozinhá-los com algumas batatas. A receita apareceu nas mesas de Paris em 1786 quando dois rapazes, vindos da cidade de Marseille, abriram um restaurante chamado Frères Provençaux (Irmãos da Provence). Longe do Mediterrâneo, os irmãos substituíram a água do mar por um caldo de peixe, o que enriqueceu muito o prato em sabor. Daí pra frente muita gente “meteu a colher” na receita com o intuito de promover esse prato regional. Muitos peixes foram testados e mais de quarenta foram catalogados como sendo os que mais valorizam o prato. Porém a verdadeira glória do delicioso ensopado veio com Frédéric Mistral que deu uma interpretação inusitada à palavra provençal usada para designar o tal bouillon (caldo): “boui abaisso” ou, segundo Frédéric, “quand ça bouille, tu baisses” (quando ferve, você abaixa- ele se referia naturalmente ao fogo). Isso tudo me fez pensar em nossos pratos à base de peixes... Estamos em Cuiabá, longe das águas salgadas, tão longe do Mediterrâneo... Temos tantos peixes saborosos, tantos temperos realçadores... Não dá pra fazer uma verdadeira bouillabaisse por essas bandas, mas dá pra fazer o Molho Rouille que sempre acompanha o prato e vai muito bem com a nossa Mujica de pintado (experimente juntar outros peixes à receita original), esse ensopado regional que também é bom à beça!!! Providencie 2 pimentões vermelhos assados e sem casca, 2 dentes de alho descascados, 1 colher (chá) de suco de limão, 1 pitada de páprica, sal e pimenta-do-reino moída na hora. Coloque todos os ingredientes no liquidificador e bata bem. Verifique o tempero e sirva sobre uma torrada com a nossa bouillabaisse de água doce. Bon appétit. Feliz aniversário Cuiabá!

sexta-feira, 1 de abril de 2011

QUE TAL UM CAFEZES?




Você sabia que o café mais caro do mundo vem da Indonésia e custa nada mais nada menos que a bagatela de 600 dólares o meio-quilo? O sabor do nobre café, segundo os entendidos no assunto, é inigualável: menos ácido e menos amargo do que os cafezinhos clássicos saboreados pelos plebeus que povoam esse planeta. Seu gosto lembra uma suave mistura de chocolate e uvas frescas, dizem alguns. A produção do Kopi Luwak é limitada a apenas 200 quilos por ano. Vê-se que ele não é mesmo pra qualquer bico (nem qualquer bolso). Deu vontade de experimentar? Saiba que o responsável por essa iguaria, acredite se quiser, é uma espécie de felino! A Civeta, um simpático gatinho africano. O bichinho come somente os grãos mais doces da planta do café. Seu organismo digere o fruto, mas não a semente que, adivinhe, sai inteirinha em suas fezes! É isso mesmo, o cocô do bichano é a matéria-prima para o inusitado café. O sistema digestivo do animalzinho tem bactérias que dão aos grãos uma “qualidade ímpar”, garantem os especialistas... Sinceramente não sei o que dizer. O que mais me intriga é a criatura (não estou falando do bicho) que iniciou a tal experiência... Já provei coró-de-coco, bundinha de tanajura; comi bicho de goiaba (muitos, com certeza) e lesmas, elegantemente batizadas de escargots e adoro mel que não deixa de ser um processo fantástico de "regurgitação" das abelhas; mas cocô de civeta, sei não, sei não... E olha que sou doidinha por café! Vamos mudar o rumo dessa prosa, já que “caca” de bicho (ainda) não tem vez na minha cozinha! E pra me redimir, vou ensinar você a fazer uma Geleia de café com gengibre que, esta sim, é o bicho! Sirva com biscoitos, pães e como cobertura de bolo de laranja... Coloque 1 folha de gelatina incolor na água para hidratar. Reserve. Leve ao fogo 2 xícaras (chá) de café coado ainda quente, 1 xícara (chá) de açúcar e 1 colher (sopa) de gengibre ralado. Ferva por 15 minutos. Desligue e deixe esfriar um pouco. Esprema a folha de gelatina e junte-a à geleia de café mexendo até que ela dissolva bem. Coloque em um pote esterilizado, tampe e deixe esfriar antes de servir. Se preferir, substitua o gengibre por 1 colher (café) de cravo em pó. Eu prefiro com gengibre. Delícia! Bon appétit!